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Carlos Alberto Marchi
de Queiroz*
Não pude evitar a gostosa gargalhada ao terminar de ler a
notícia publicada pelo Correio Popular,
de 3 de agosto, A3, relatando que sexo
por telepatia virou caso de polícia em Limeira.
Não é de hoje que as delegacias e distritos policiais do
Estado de São Paulo enfrentam casos semelhantes trazidos ao conhecimento da
autoridade e que merecem redobrada atenção por ocasião de sua triagem, antes de
serem reduzidos a registro digital de ocorrência, virando B.O.
Durante minha longa carreira de
delegado de policia enfrentei casos semelhantes, dando-lhes adequada solução,
como passo a relatar. Na década de 80, do século passado, quando plantonista
num remoto distrito na Zona Leste de São Paulo, fui procurado, durante uma fria
madrugada, por um zelador de escola municipal relatando-me que um disco voador
acabara de pousar, com suas fortes luzes,
mas sem ruídos, no campo de futebol da escola.
Dirigi-me, de imediato, para o
local do fato com alguns policiais de minha equipe. Nada constatei de estranho.
A grama não estava queimada. Nem havia marcas de um eventual trem de pouso da
nave interestelar. Aconselhei o homem a ficar de campana, pedindo-lhe que me
avisasse caso o objeto voador não identificado voltasse ao estabelecimento
escolar a fim de que pudéssemos elaborar um boletim de ocorrência bem circunstanciado.
O homem não retornou ao plantão
Anos depois, episodicamente
trabalhando como titular do 3º DP de São Paulo, atendi um senhor que
entregou-me uma petição pedindo instauração de inquérito contra um morador do prédio ao lado, no Largo do
Arouche, próximo à Praça da República. O reclamante, em seu petitório, acusava
o vizinho de estar prestes a concluir a construção de um canhão eletrônico que
dispararia o “raio da morte”, matando os delicados frequentadores do conhecido
local. Educadamente, como permite a lei processual penal, indeferi o pedido, instruindo-o
a recorrer ao secretário da Segurança Pública. Também, não retornou. Acho que
não recorreu.
No final do século passado, um
delegado do interior paulista indiciou São Pedro por suposto crime de dano. A
autoridade, que depois prestou contas à Corregedoria, ao ser procurada por um
proprietário de motel, reclamando que, durante uma tormenta, um raio caíra
sobre a antena parabólica, queimando todos os televisores dos quartos, não
vacilou em fazer o boletim, exigido pelo seguro, indiciando o porteiro do
Céu!!! A notícia correu o mundo.
O estupro telepático supostamente
ocorrido em Limeira, pelo seu ineditismo, deverá fazer idêntico percurso. A
leitura da notícia revela que a delegada e a escrivã de seu cargo já tomaram o
depoimento, mediante termo de declarações da vítima, uma farmacêutica,
oficializando tudo sobre o papel. Não sei como é que a autoridade irá positivar
a antijuridicidade concreta do evento!!! Não consigo, por mais que me esforce,
entender como a delegada formou sua convicção íntima. Teria
ela se amedrontado sobre uma suposta reclamação da suposta vítima à Corregedoria,
ao Ministério Público ou ao bispo de Butiá?
Pior de tudo é que o suposto
atacante telepático seria um oficial do Exército, circunstância que poderá
provocar até desdobramentos castrenses. As características do crime, tido como
hediondo, tornaria o sujeito ativo indigno do oficialato. Fico preocupado com a
atitude do juiz de direito irá cuidar do caso. Como será que Sua Excelência irá
conceder medidas protetivas à boticária vítima, que pretende deixar Limeira
voltando para o seu torrão natal? E o órgão do Ministério Público como irá erguer-se, ereto, nessa teratológica hipótese de violação?
Numa época em que a Polícia Civil,
de 40.000 cargos, atolada em inquéritos,
sente a falta de 14.000 autoridades e agentes, sem que se compute os claros do
IML e do IC, não tendo nem quadros especializados para auxiliar o Poder
Judiciário na avançada política criminal da novíssima audiência de custódia,
ora implantada em Campinas e em Jundiaí, a delegada da DDM de Limeira dá-se ao
luxo de investigar esse inusitado caso. Ou estaria de brincadeira, como se diz
atualmente?
Sabe-se que a Polícia Civil sente
crônica falta de pessoal para realizar uma investigação policial de qualidade.
Todavia, o episódio serve para que, no futuro, a Polícia Civil conte com
assistentes sociais e psicólogas, como acontece nas melhores polícias do mundo
na atualidade. Com isso, evitar-se-ia a
exposição ao ridículo de uma instituição centenária que faz das tripas coração
para atender os justos reclamos de segurança pública vetorados pela
desassistida população, sempre esquecida pelos políticos de plantão.
*Carlos Alberto Marchi de Queiroz
é professor de direito e membro da Academia Campinense de Letras.
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