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por Carlos Alberto Marchi de Queiroz*
Nos primeiros dias de fevereiro de 2010, o nobre governador do Estado enviou à Assembleia Legislativa projeto de emenda constitucional – PEC, no sentido de repristinar o nome Força Pública do Estado de São Paulo, afastando a atual denominação Polícia Militar do Estado de São Paulo.
A atitude governamental causou forte impacto nos órgãos de imprensa, no âmbito da Polícia Civil e nas hostes da milícia estadual, principalmente no tocante à sua eventual inconstitucionalidade.
A imprensa escrita revelou que a PEC governamental teria se transformado em um divisor de águas dentro da PM uma vez que parte considerável da tropa e da oficialidade manifestaram, dentro dos limites de urbanidade, contrariedade à mudança de denominação, prevalecendo a vontade do digno coronel comandante-geral da corporação.
A denominação força pública aparece, pela primeira vez, na História da Humanidade na Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, proclamada pela Assembleia Constituinte francesa, em 26 de agosto de 1789, nos seguintes artigos:
Art. 12.º A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública; esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada.
Art. 13.º Para a manutenção da força pública e para as despesas de administração é indispensável uma contribuição comum que deve ser dividida entre os cidadãos de acordo com suas possibilidades.
Com semelhante base legal, os países europeus passaram, paulatinamente, a constituir suas forças públicas, de sorte que, em Portugal, surge a Guarda Republicana, acolitada por polícias municipais e de fronteiras. No mesmo sentido, a Espanha implanta a sua Guardia Civil, apoiada por polícias municipais e de fronteiras.
A França, após a era napoleônica, institui a Gendarmerie Nationale, auxiliada por polícias municipais e de fronteiras, como se pode ver na primeira versão do filme O Dia do Chacal. A Itália, por seu turno cria os famosos Carabinieri, coadjuvados pela polícia de finanças, pelas polícias municipais e de fronteiras.
Nesse contexto, força pública é o conjunto de organizações policiais de caráter preventivo, em um dado momento histórico de cada país. No Brasil, a força pública paulista atingiu o seu melhor conceito doutrinário entre 1936 e 1947, quando sua polícia ostensiva era composta pela Força Policial do Estado de São Paulo, pela Guarda Civil do Estado de São Paulo e pela Polícia Marítima, Aérea e de Fronteiras.
A expressão força pública surge em alguns artigos do Código de Processo Penal em vigor, com o significado de organismo policial de caráter ostensivo, à disposição das autoridades policiais e judiciárias brasileiras.
É do conhecimento dos estudiosos de policiologia que a Polícia Militar do Estado de São Paulo, dentro de suas gloriosas tradições, ostentou os nomes de Força Policial e de Força Pública, por mais de uma vez, até o ano de 1970, ocasião em que todas as milícias estaduais passaram a ser chamadas de Polícias Militares, exceto a milícia gaúcha, que continuou mantendo o seu tradicional nome Brigada Militar.
Longe de querer censurar a PEC ora em trâmite na Assembeia Legislativa, as expressões força pública e polícia militar foram cunhadas de forma equivocada no Brasil, uma vez que a primeira, force publique, de origem francesa, e a segunda, military police, de origem norte-americana, revelam conteúdos diversos daqueles usados no Brasil.
Força pública e polícia militar, já analisadas, são substantivos compostos que data maxima venia não podem rotular genericamente instituições policiais, como fazem corretamente Portugal, Espanha, França, Itália, Alemanha e Inglaterra, estes dois últimos países por nós não analisados.
Polícia militar, substantivo composto, vem sendo utilizado no Brasil a partir da década de trinta, quando os estados brasileiros chamavam suas milícias de Polícia Militar, Força Policial ou Força Pública, ocorrendo a unificação após a Revolução de 1964.
Polícia militar, na sua essência de military police, é um grupamento de todos os exércitos do mundo, destinado policiar seus quadros em áreas de operação ou de conflito, como a PM da FEB, formada por guardas-civis da Guarda Civil de São Paulo, na 2ª Guerra Mundial.
Outras polícias militares brasileiras são a Polícia da Aeronáutica, PA, e a Polícia da Marinha, SP, ou melhor, shore patrol, i.e, patrulha da praia, instituidas para conter os excessos dos aviadores e dos marujos.
Assim sendo, é preciso que os dignos deputados estaduais mergulhem fundo nos livros de História do Brasil, a fim de que possam dar uma solução sábia para essa delicada questão, uma vez que a Força Pública do Estado de São Paulo (1947-1970) deu mais apoio no combate à esquerda, do que a Polícia Militar paulista.
Parece-nos que a questão levantada pelo governo estadual deve passar, necessariamente, pelo crivo da Inspetoria Geral das Polícias Militares – IGPM, órgão do Exército Brasileiro, incumbido da fiscalização das milícias estaduais, uma vez que alguns constitucionalistas pátrios já sussurram sobre eventual inconstitucionalidade da matéria.
Países eslavos, da Europa Central, distinguem bem as forças públicas das polícias judiciárias, chamando-as de Milicja e Policja, solução que não queremos para o nosso Estado face às tradições históricas da Polícia Militar e da Polícia Civil bandeirantes.
Finalizando, desejamos salientar, para não ferir suscetibilidades, que o texto segue as formas de redação e estilo dos jornais brasileiros, cabendo lembrar aos legisladores que procurem buscar, pelo menos, uma outra alternativa onomástica para a nossa co-irmã, uma vez que os substantivos compostos policia militar e força pública são gêneros e não espécie da atividade policial.
(*) Carlos Alberto Marchi de Queiroz é Delegado de Polícia de classe especial, professor de Direito e na Academia de Polícia e escreve em especial para o site da International Police Association – IPA.
fonte:http://adpesp.org.br/artigos/detalhe/136