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Carlos Alberto Marchi de Queiroz*
A morte de uma jovem, vítima de
estupro coletivo na cidade de Nova Délhi, na Índia, em dezembro de 2012,
repercutiu em todo o mundo, de forma inusitada, seja pelo seu ineditismo, seja
pela reação coletiva provocada em um país de mais de um bilhão e duzentos
milhões de habitantes. A psicologia das multidões desempenhou importantíssimo
papel nesse macabro episódio de violência contra mulheres jovens.
Os autores, presos pela polícia
indiana, logo após os fatos, foram imediatamente indiciados e formalmente
denunciados pela polícia, acusados de crimes que podem vir a ser punidos com a
aplicação de pena capital. Por mais estranho que possa parecer ao leitor, a
denúncia do crime é formulada, na Índia, pela própria polícia, e não pelo
Ministério Público, como no Brasil, o que não significa que o órgão ministerial
deixará de atuar no caso. Muito pelo contrário. Após o recebimento da denúncia,
ofertada pela polícia, o Ministério Público ingressa na ação penal indiana em
condições idênticas à da defesa dos acusados. A Índia segue o modelo processual
inglês do Royal Prosecutor, do acusador real, cujo desempenho pode ser visto no
filme "Testemunha de acusação", com Tyrone Power, Marlene Dietrich e
Charles Laughton, em inesquecíveis papéis.
Todavia, não nos move o propósito
de escrever um artigo sobre policiologia ou sobre processualística criminal mas,
sim, analisar ainda que à distância, alguns aspectos que poderão, de repente,
contribuir para o aperfeiçoamento de nossas instituições, no que tange à
repressão dessa modalidade de crime hediondo que choca a todos, inclusive aos
encarcerados.
Todos aqueles que leram o
noticiário a respeito da jovem vítima, que veio a falecer, ainda que tendo sido
removida para um hospital de referência em Cingapura, não deixaram de perceber
que o crime provocou violenta reação da população nas principais cidades
indianas, notadamente em Calcutá, Hyderabad e Mumbai, a antiga Bombaim, além de
Nova Délhi, cenário do crime.
Qual o segredo da República da
Índia, com uma população superior a 1 bilhão e 200 milhões de habitantes,
apesar do crime que vitimou a "filha da Índia", apresentar índices de
criminalidade insignificantes? Em primeiro lugar, deve-se levar em conta que a
religião é forte instrumento de controle social e que o hinduísmo, o islamismo,
o cristianismo, o budismo e o siquismo colaboram para que a Índia apresente
baixíssimos índices de criminalidade. Nação milenar, apesar da diversidade
religiosa, onde a minoria católica é superior a 200 milhões de fiéis, tem na
família um forte aliado no combate ao crime. O modelar sistema
policial-judiciário, aliado a uma exemplar execução penal, fazem com que aquela
nação, que tem, em média, 240 habitantes por quilômetro quadrado, possa
apresentar ao mundo índices extremamente baixos de criminalidade. A forca, que
um dos assassinos da "filha da Índia" disse merecer, é um dos maiores
dissuasores da delinquência. Ademais, representa humilhação extrema para
qualquer um de seus filhos, como pudemos constatar quando ali estivemos a
serviço.
Todos aqueles que leram a
infausta notícia da morte da estudante
de fisioterapia, de 23 anos, que foi estuprada e espancada até a morte, no
interior de uma falsa van de passageiros, devem ter se surpreendido com as estatísticas
oferecidas pela imprensa internacional. Em um país de 1 bilhão e 200 milhões de
habitantes, foram registrados, em 2011, 256.329 crimes violentos, dos quais 90%
cometidos contra mulheres. São números oficiais, que, ao mesmo tempo que nos
consolam, causam espanto uma vez que
vitimizam mulheres, em sua maioria. A Índia não possui legislação equivalente a
nossa Lei Maria da Penha.
De qualquer forma o criminoso, na
Índia, sabe que o país possui rigorosa execução penal e que os mais cruéis assassinos
acabam sempre dançando na ponta da corda da forca.
*Carlos Alberto Marchi de Queiroz é Delegado de Polícia e Professor da Academia de Polícia do Estado de são Paulo