Sindicatos afirmam que faltam
pelo menos 13.913 policiais civis, 30% do efetivo fixado; Secretaria da
Segurança Pública fala em 6.749
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Felipe Resk, Bruno Ribeiro e
Marcelo Godoy,
O Estado de S.Paulo
Faltam cada vez mais policiais
civis nas delegacias de São Paulo. O déficit de delegados, responsáveis por
conduzir investigações criminais, já atinge uma a cada seis vagas estabelecidas
para o cargo no Estado. Entre investigadores e escrivães, a proporção é de um
para quatro. Na visão de agentes de segurança e especialistas, os índices
revelam o "sucateamento" da Polícia Civil.
Com quadro desfalcado, os
distritos policiais deixam de esclarecer delitos e punir os autores, além de
piorar o atendimento prestado à população. A gestão Geraldo Alckmin (PSDB) diz
que não pode efetuar contratações neste momento.
Sindicatos das categorias
afirmam, com base em dados publicados no Diário Oficial do Estado do dia 30 de
abril, que faltam pelo menos 13.913 policiais civis em São Paulo, ou cerca de
30% do efetivo fixado. Já a Secretaria da Segurança Pública (SSP) diz que a
diferença para o quadro existente é menos da metade: 6.749 policiais. Foi esse
número que o delegado-geral de São Paulo, Youssef Abou Chahin, expôs ao
secretário Mágina Alves Barbosa Filho na semana passada.
Na ocasião, Chahin apresentou ao
titular da Segurança Pública um estudo sobre o déficit da Polícia Civil, na
sede do Palácio da Polícia, em São Paulo, em que se mostrou preocupado com o
envelhecimento do quadro e o número de aposentadorias, que cresce a cada ano.
Projeções apontam que, se o ritmo continuar e não houver reposição, o efetivo
de delegados, que hoje tem cerca de 2,9 mil pessoas, pode chegar a 600 em três
anos.
Atualmente, 560 das 3.463 vagas
para o cargo – ou 16,17% – não estão preenchidas. “O claro é gigante. Hoje não
tem metade dos policiais que havia quando eu entrei na Polícia Civil, há mais
de 30 anos”, afirma um delegado titular que atua na capital. Por causa do
déficit, um único profissional chega a presidir 1,2 mil inquéritos. “É
humanamente impossível investigar tanta coisa, não vai dar resultado nenhum”,
diz George Melão, presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de
São Paulo (Sindpesp).
Sem notícia. Na prática,
significa que muitas vítimas acabam sem uma resposta do Estado. E criminosos
ficam impunes. Em março de 2015, a psicóloga C. R. W., de 61 anos, estacionou o
carro em uma rua de Santo Amaro, na zona sul de São Paulo, quando foi abordada
por um assaltante. Era fim de tarde.
A vítima gritou por socorro e
chegou a entrar em luta corporal com o criminoso. Na confusão, o bandido
conseguiu arrancar com o veículo, arremessando a mulher no asfalto. Ao bater a
cabeça, ela sofreu traumatismo craniano. Morreu no hospital nove dias depois.
O caso foi registrado como
latrocínio (roubo seguido de morte) e, segundo familiares, nunca foi
esclarecido. “Já completou um ano e meio da morte e a polícia nunca deu
notícia”, diz um parente, que pediu anonimato e sigilo do nome da vítima.
Para ele, a polícia não teve
“nenhum interesse em investigar”. “O carro chegou a receber multa por excesso
de velocidade e apareceu três meses depois, intacto. Dentro dele, havia um
monte de objetos que não eram nossos: livros, óculos, peças íntimas. Não
acredito que foi feita a perícia porque eu mesmo recolhi os materiais.”
Segundo dados do Sindpesp, apenas
2,5% dos crimes são esclarecidos em São Paulo. Para os casos de homicídio, o
índice aumenta para cerca de 40%. Os números divergem dos da SSP, que diz
solucionar 62% dos homicídios e 84% dos latrocínios. “Em termos de estrutura de
trabalho, é a pior situação que eu vi. A Polícia Civil está sucateada. O
trabalho de investigação parou”, afirma Melão.
O especialista em segurança
pública Guaracy Mingardi diz que é preciso reequipar os quadros da Polícia
Civil e dar prioridade às investigações. “A prioridade do governo tem sido
manter o efetivo da Polícia Militar e deixar o da Civil de lado. Isso revela
uma preocupação muito maior com a ordem do que com o esclarecimento do crime”,
diz. “Atualmente, as delegacias são locais para registrar boletim de ocorrência
e abrir inquérito de autoria conhecida.”
Atendimento. Em São Paulo, o
déficit de escrivães e de investigadores é de 2.180 e 2.851, respectivamente,
conforme os dados de abril. O número representa 24,45% e 23,84% do total de
vagas fixadas para cada uma das carreiras. “A situação está pior no interior,
onde as delegacias estão recebendo funcionários de prefeituras, que não são
policiais. Se tirar essas pessoas, 70% dos distritos fecham”, diz Melão.
Para João Xavier Fernandes,
presidente do Sindicato dos Escrivães de Polícia do Estado de São Paulo
(Sepesp), o vazio nos quadros prejudica o atendimento nos DPs. “As pessoas
estão encontrando as delegacias fechadas, em razão da falta de recurso. A
vítima deixar de acreditar na polícia”, diz. Em agosto, o Estado revelou que as
denúncias de má qualidade no atendimento da Polícia Civil aumentaram 18% no
primeiro semestre de 2016, segundo relatório da Ouvidoria da Polícia. Foram 220
reclamações, ante 186 no mesmo período do ano anterior.
“Fui até a delegacia para que
pudessem me tomar um depoimento e fazer o BO, mas encontrei pessoas mal
educadas e levei ‘chá’ de cadeira”, conta o administrador Luiz Henrique
Cabreira, de 37 anos, alvo de estelionato. Após aplicar um golpe, o criminoso
fugiu com o celular da vítima. “Cheguei a levar a cópia de gravações do local,
e nunca tive resposta. Fui três, quatro vezes na delegacia, e nada.”
OUTRO LADO: Secretaria alega que
aposentadorias agravaram quadro
Em nota, a Secretaria da
Segurança Pública (SSP) afirma que o déficit no quadro da Polícia Civil foi
agravado a partir de 2014, pela Lei Complementar 144/2014, que baixou em cinco
anos o teto para aposentadoria de policiais e estabeleceu idade máxima de 65
anos. “Com isso, houve a aposentadoria compulsória de 862 policiais civis entre
2014 e 2015”, diz. A regra foi revogada em 2015, mas os cargos não foram
restituídos automaticamente.
A pasta também afirma que
incorporou por concursos 686 novos policiais, entre escrivães, investigadores e
delegados, neste ano. “Ainda há investigadores e escrivães em formação na
Acadepol (Academia de Polícia).”
“O governo de São Paulo adverte
ainda que, além disso, não pode efetuar contratações neste momento. Isso
porque, a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) prevê que o governo estadual não
gaste mais de 46,55%, limite prudencial para gastos com funcionalismo”, afirma
a SSP. Segundo a Secretaria de Comunicação, São Paulo gasta 46,37% de sua
arrecadação com o pagamento da folha. “A medida que as receitas caem, o
porcentual de despesa não pode ultrapassar o limite da receita. O Brasil
atravessa, como se sabe, a maior crise de sua história.”
A secretaria ainda destacou que o
governo também tem investido na delegacia eletrônica, o que permite aos
cidadãos registrar ocorrências sem a necessidade de ir a um distrito policial.
Em 2011, 724,6 mil ocorrências foram registradas por meio da delegacia
eletrônica. Em 2015, o número chegou a 1.203.147, aumento de 66%. Nos primeiros
seis meses de 2016, 613 mil ocorrências foram registradas por meio da Delegacia
Eletrônica. “Além disso, desde 2011, a Policia Militar passou a registrar
ocorrências nas suas unidades, com o propósito de aumentar as opções do
cidadão”, completa a nota oficial.
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