sexta-feira, 28 de agosto de 2015

O STF e as Guarda Municipais


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Carlos Alberto Marchi de Queiroz

No último dia 6 de agosto  o Supremo Tribunal Federal autorizou as Guardas Municipais de todo o País a aplicar multas de trânsito, consolidando, ainda mais, a sua posição  no sistema nacional de segurança pública.
A notícia, veiculada pelo Correio Popular, de 7/8, A12, instiga-me a discorrer sobre a saga das Guardas Municipais que surgiram, timidamente, na segunda metade do século XX.
O promotor dessas corporações foi, indubitavelmente, o então prefeito de São Paulo, Jânio da Silva Quadros que, em 15 de setembro de 1986, implantou sua Guarda Civil Metropolitana .
Jânio, que abalara o Brasil renunciando à presidência em 25 de agosto de 1961, embarcando,  depois, em Santos, a bordo de cargueiro misto inglês, rumo à Inglaterra, apaixonou-se, perdidamente, pela Polícia Metropolitana de Londres, localizada no bairro de Scotland Yard, de onde advém seu famoso apelido.
A paixão de Jânio pela Scotland Yard fê-lo cobrir seus guardas de azul marinho, à semelhança dos bobbies londrinos. Anteriormente, Jânio, ao governar o Estado, entre 1955 e 1959, instituiu a Polícia Feminina, anexa à Guarda Civil de São Paulo, vestindo suas integrantes com fardamento azul marinho, idêntico ao usado pelas mulheres policiais inglesas.
No dia 5 de outubro de 1988, as Guardas Municipais, até então vistas com desdém pelos governos estaduais, acabaram institucionalizadas pelo Capítulo III, da Lei Maior, cujo parágrafo oitavo do artigo 144 estabelece que os “Municípios poderão instituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei”.
A despeito da rejeição demonstrada pelas secretarias de Segurança Pública da maior parte dos Estados, as Guardas passaram, paulatinamente, a transpor os calços constitucionais fixados pelo Pergaminho Maior.
No começo da década de 90, as GMs encontraram alguma resistência por parte do Poder Judiciário que recusava-se a admitir que pudessem dispor de poder de polícia de segurança, relaxando, sistematicamente, autos de prisão em flagrante em que  guardas municipais figuravam como  condutores.
Caso emblemático ocorreu em Santos, frente ao Parque Balneário Hotel, quando guardas prenderam em flagrante autor de disparo de arma de fogo. Tão logo a comunicação constitucional chegou às mãos do juiz de plantão, Sua Excelência determinou a soltura imediata do malvivente, uma vez que, no seu entendimento, guarda municipal  não tinha poder de polícia, contrariando a dicção do artigo 301 do CPP, que permite  prisão em flagrante por qualquer do povo.
Apesar da procela, Campinas criou sua Guarda Municipal, em 1991, durante o governo de Francisco Amaral, tendo como diretor o delegado de polícia Ruyrillo Pedro de Magalhães, diplomando sua primeira turma de agentes em 14 de julho de 1997.
Mesmo diante dessas vicissitudes, as Guardas Municipais vêm realizando, com sucesso, prisões em flagrante, apreensões expressivas de drogas, abordagens de suspeitos, portando, com competência, armas de fogos, tonfas e algemas, apoiando, com proficiência, ações das polícias civis e militares em todo o Brasil.
Agora, o STF, reforçando entendimento anteriormente pacificado, de que essas corporações têm poder de policia, reconhece que podem aplicar multas  sobre qualquer espécie de infração de trânsito cometida nas cidades, contrariando o ministro Marco Aurélio.
Essa decisão pioneira, proferida na ação em que figurava como interessado o município de Belo Horizonte, produz reflexos sobre todos os municípios cujas Guardas estejam impedidas de multar pela Justiça. Muito embora não exista nenhuma proibição legal para que apliquem multas, algumas ações tramitam pelo STF, contestando a prática.
Na ação que provocou a decisão do Supremo, o Ministério Público de Minas Gerais contestava a ação da Guarda Municipal de BH em matéria de trânsito, argumentando que a corporação não poderia usurpar atribuições da Polícia Militar mineira.
O julgamento, iniciado em maio, teve como relator o ministro Marco Aurélio Mello, conhecido como “Voto Vencido”, cujo voto admitiu a aplicação das multas pelos guardas, desde que limitadas a infrações de trânsito que pudessem afetar a proteção de bens, serviços e instalações municipais.
A decisão do STF, que reforça aquela que, anteriormente, conferiu poder de polícia de segurança aos agentes municipais, pavimenta o caminho para que, no futuro, as Guardas Municipais  sejam transformadas em Polícias Municipais, na esteira de PEC apresentada pelo falecido senador Romeu Tuma.
Mais dia, menos dia, as Guardas Municipais, revolucionando o superado modelo português de polícia, até hoje vigente no País, serão transformadas em Polícias Municipais, como acontece nos países civilizados, acabando, de vez, também, com a nefasta indústria das multas. Quem viver verá.

*Carlos Alberto Marchi de Queiroz é professor de Direito e membro eleito da Academia Campinense de Letras.

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