segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Mensalão: Quadrilha ou bando?

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Carlos Alberto Marchi de Queiroz
A ação penal 470 do STF, conhecida popularmente como o Caso do Mensalão, aproxima-se, aparentemente, do seu final. Os ministros da Suprema Corte começaram a examinar os embargos de declaração, de menor complexidade processual, e que visam esclarecer trechos supostamente obscuros dos votos .
Brevemente, os onze ministros passarão a analisar os embargos infringentes do julgado, interpostos , principalmente, pelas defesas dos onze condenados pelo crime de quadrilha ou bando, popularmente conhecido como crime de formação de quadrilha, e que conseguiram quatro votos absolutórios, cada um, base legal para os apelos.
Esses onze réus, que gozam de foro privilegiado, foram condenados nos termos do artigo 288 do Código Penal de 7 de dezembro de 1940, em vigor, e que diz: “ Associarem-se mais de três pessoas , em quadrilha ou bando, para o fim de cometer  crimes. Pena: reclusão de um a três anos”.
O crime de quadrilha ou bando, e não de formação de quadrilha, surgiu no Brasil na década de 30 do século passado, a fim de dar combate ao capitão Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, que , após conseguir uma carta patente através do senador Floro Bartolomeu, descambou para a prática do cangaço,  afastando-se do padre Cícero.Lampião, ainda nos tempos da legalidade, deu combate à famosa Coluna Prestes.
Estudiosos da História do Direito Penal brasileiro também dizem que esse crime pode ser uma importação cultural vinda dos Estados Unidos da América que, nessa mesma época, através de J. Edgar Hoover, fundador do FBI, que passou a dar combate aos gangsters e aos mobsters, quadrilheiros ou bandidos, conseguindo junto ao Congresso , fazer passar uma lei federal,  para combater Bonnie Parker  e Clyde Barrow, John Dillinger e, especialmente, Al Capone.
No dia 2 de agosto de 2013, a presidente Dilma Rousseff sancionou a Lei n° 12.850, para combater, com mais eficácia, o crime organizado no Brasil, e, no encerro desse diploma legal, alterou o artigo 288 do Código Penal, cuja ementa lateral passou a ser associação criminosa e não mais quadrilha ou bando. O novo texto do artigo 288 preceitua: ”Associarem-se três pessoas ou mais  com o fim específico de cometer crimes” . Essa diminuição de agentes não constitui novidade no Brasil, uma vez que para a Lei de Drogas bastam duas pessoas para formar uma associação para o tráfico.
O que nos preocupa neste caso é que, no jardim da infância do Direito, os alunos das faculdades aprendem que a revogação de uma lei se dá pela promulgação de uma nova lei, que, de forma expressa,ou tácita, revoga as disposições em contrário, como   aconteceu com a promulgação da Lei n° 12.850, e que entrará em vigor, o mais tardar, no dia 16 de setembro de 2013.
Ainda que mantendo a essência do crime, a mens legis, a redação do novo tipo penal, a mens legislatoris, revoga tacitamente o crime de quadrilha ou bando, a tal ponto que altera sua ementa lateral, quadrilha ou bando, para associação criminosa. O tumulto processual certamente, irá surgir por ocasião do início do cumprimento das penas aplicadas por infringência ao crime de bando ou quadrilha, O juiz de execução penal não poderá mais executá-la uma vez que esse crime, a partir do início da segunda quinzena de setembro deixará de existir no País.
A Lei n° 12.850/13, de conteúdo estupendo no que tange ao combate ao crime organizado pela Polícia Federal e pelas polícias civis estaduais, abrindo grande espaço ao Ministério Público, ao revogar a Lei n° 9.034/ 95, por descuido do legislador, ainda deixa em aberto o crime de bando ou quadrilha que continua a existir no parágrafo único o do artigo  8° da Lei n° 8.072/90, que define os crimes hediondos .
Os crimes de sedução, posse sexual mediante fraude, adultério deixaram de existir no Brasil posto que revogados expressamente por leis federais recentes. O crime de quadrilha ou bando, equivocadamente conhecido como formação de quadrilha, foi revogado pela lnova lei do crime organizado. O cochilo do legislador impedirá que os onze condenados cumpram suas penas do crime que nasceu no bojo da Consolidação das Leis Penais .
E mais, o uso da analogia, proibida no Direito Penal, vai impedir que o juiz de execução penal exerça o seu mister dentro da legalidade constitucional. Como dizem os italianos, fatta la legge, trovato l’inganno...
*Carlos Alberto Marchi de Queiroz é professor de Direito

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